AIRTON MONTEIRO - FAZER OU COMPRAR FEITO...
Eu também sou brasileiro. Também gosto de boa vida. “Que céu, que mar, que rios, que florestas. A natureza aqui perpetuamente em festa” como dizia Olavo Bilac, e a gente numa boa!
Por Flávio José Jardim
atualizado há 5 anos
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Sou a favor do Ócio Criativo de Domenico de Masi e árduo defensor do: ‘deixa pra lá’; ‘tem pressa não’; ‘amanhã a gente vê’; ‘depois eu faço’!
Não fosse assim, eu não seria brasileiro, mas suíço.
Mas tudo tem limites. O nosso ‘Herói Sem Caráter’, Macunaíma, aliás, parecidíssimo com um dos nossos heróis dos últimos tempos, não pode servir de paradigma ou se quiserem, de referencial, para se ter sucesso.
Deus queira que essa pandemia nos acorde dessa letargia de 500 aninhos de berço esplendido.
Faz tempo, desde o Brasil Colônia, que a gente elegeu a preguiça como nossa maior característica, e Dorival Caymmi, que Deus o tenha, como Sumo Sacerdote, mesmo que com isso fossemos, ludibriados, roubados ou passados pra trás, como costumamos dizer.
Criamos, importamos ou adaptamos certos serviços de outros lugares mas que, aqui, serviu mesmo, para nos deixar espreguiçando na rede.
Corretor, despachante, atravessador, intermediário, entregador, carregador e alguns mais novos, como consultor, analista de gestão e vai por ai afora. Quase nunca acrescentam nada à cadeia de valor. Se acabarem, a gente só vai sentir falta, devido a preguiça!
Como Serviços, essas atividades servem, apenas, para facilitar alguma coisa, facilitar a nossa vida, e isso é válido!
Mas, se eu mesmo posso fazer, não preciso deles. A tecnologia da informação está acabando com muitos deles. E vai acabar com muito mais, Olha o desespero ai, gente!
Contanto que eu não tenha de me levantar da minha rede...
Concordo! A preguiça é o maior vetor de criatividade e de desenvolvimento da humanidade.
Não fosse ela (e a nossa tão propalada inteligência), ainda estaríamos quebrando pedra e trepando em árvores.
Vejam as formigas, por exemplo, há milhares de anos carregam aquelas folhas mais pesadas e maiores que elas e foram incapazes de inventar a roda ou o caminhão. Bichinhas burras! Tá vendo como a preguiça serve para alguma coisa.
A última grande invenção da preguiça brasileira foi a terceirização. Sim. A invenção é nossa! Os americanos criaram o outsourcing, cujo significado da palavra é um pouco diferente. Mas aqui, serviu e continua servindo mesmo é à nossa preguiça. Passa para os otários, tudo que é pesado, tudo que dá trabalho, tudo que é difícil, tudo que exige esforço... Continua e continua e continua.
Por falar nisso, nunca é tarde para lembrar que democracia representativa, essa que a gente elege um deputado para ele nos representar no parlamento, é atualmente a forma mais asquerosa de terceirização.
Vocês estão lembrados como eram as coisas no início do século passado, ou por nele terem vivido ou por terem ouvido falar?
Já existiam todas essas coisas, mas apenas para determinadas situações, ou necessidades diferentes.
Fim de semana, a classe média comia galinha ou cozido, uma mistura de ossos de boi temperados com muitos legumes, e depois se fazia um pirão do caldo.
Mas, quando se podia, era galinha. Bichinha cara e rara (aliás, tudo que é raro, é caro!). Mas não se podia matar as galinhas, todo domingo. Nem as dos ovos de ouro nem as de pôr e chocar.
Elas eram criadas no nosso quintal para nos dar ovos que serviam inclusive para fazer bolos que substituíam os pães. E assim não se dava fim aos meios de produção, as galinhas, ou se quiserem, nossos bens de capital!
Grande parte dos temperos também estavam no quintal. O chuchu dava às pencas na cerca do quintal. Daí aquela expressão, velha conhecida: ‘dá mais do que chuchu na cerca’! Jerimum, era só deixar, que ele crescia no meio do mato. Coentro e cebolinha dava nos potes que ficavam na janela da cozinha, e o resto se trocava com a vizinhança.
Já existiam aqueles que tinham um sitiozinho e plantavam tomates e macaxeira pra gente comer ou mandioca para fazer massa e farinha, o excedente da produção, e a gente comprava as coisas mais difíceis como: o café, o sal e o açúcar. Lá em casa não se comprava açúcar porque se fazia no engenho.
Mas, também não tinha queijo porque não tinha onde criar vaca. Uma coisa compensava a outra. É assim que se faz uma nação! Viu! Não é indo buscar tudo fora, não!
E vivíamos muito bem, obrigado. Havia as feirinhas do sábado para trocar receitas, saber as novidades, rever os amigos do interior e complementar a alimentação.
Em Pernambuco, não havia muito espaço para a chamada lavoura de subsistência, por causa da ‘monocultura’ da cana de açúcar, que alguns chamavam ‘latifúndio improdutivo’.
Vivi isso, pelo lado de dentro, nasci e me criei, no meio de um canavial. Tudo era cana. E a grande briga política, a grande ‘luta’, como um certo político costuma dizer, era em prol do operário da cana. Compraram bicicleta, óculos escuros, radinho de pilha! Em Prol! Sei!
A luta por um espaço para os camponeses plantarem. Política e políticos sempre eles.
Conseguiram, O resultado está ai. Acabaram-se os canaviais e Pernambuco deixou de ser o maior exportador de açúcar do mundo. Acabaram-se os cortadores de cana, que não viraram agricultores e vieram sofrer nas insalubres fabricas da capital; também vi isso bem de perto. Acabaram-se os estivadores do Porto do Recife; para onde terão ido aqueles guarda-roupas?
As grandes usinas foram para São Paulo e Alagoas e, as terras, todas aquelas terras... estão plantadas de frutas e verduras???! Viraram minis e macros latifúndios improdutivos, mesmo!
Quem passar pela BR 232, poderá ver isso: resultado das lutas políticas da década de 1960. Nem um pezinho de coentro. Com exceção de Natuba, em Vitoria de Santo Antão, que sempre existiu, como área de hortifrútis.
Carnaval, Natal, Festa do Padroeiro e corria todo mundo para comprar pano nas Lojas Paulistas, Casa José Araújo e outras, para nossas mães fazerem nossas domingueiras ou, quando elas não tinham a habilidade, encomenda-las a Dona Severina, nossa costureira.
Fábrica de tecidos? Vou tentar lembrar algumas: Coronel Othon na Macaxeira; Paulista dos Lundgren’s; Cia. Industrial de Camaragibe; Belgique Brésilienne de Moreno; TSAP; Tacaruna, Fábrica da Torre. Por favor, a defunta que eu esqueci, me perdoe. De onde vêm mesmo, os panos, hoje?
Costureira, alfaiate? Que nada! É tudo prêt-à-porter que, apesar do nome, dificilmente vem da França. Vem de onde?
Timbaúba era o reinando dos calçados. Ainda é? Estamos usando pisantes de onde?
Parece que esse vírus é antigo!
Me lembro, do caminho de Pesqueira para Arcoverde, o Vale do Mimoso, plantado de tomate, de cabo a rabo.
Ainda me lembro das plantações de figo e de goiaba.
E lembro da Semana Santa, quando as frutas e verduras faziam o sabor da festa. Uma animação especial, com tudo que descia da Serra de Ororubá, hoje reserva indígena.
Além de fechar a Serra, acabaram-se as fábricas de extrato de tomate e de doces, também fechadas.
Hoje se compra tudo no supermercado. O leite da vaquinha ou da cabra; os ovos das galinhas, o coentro e a cebolinha.
Frutas e verduras em Pesqueira, como de resto, nos demais locais do estado, vão primeiro para a CEASA e depois voltam para o interior, num resultado excelente, do planejamento da produção centralizada e de desperdício monumental de dinheiro e de materiais, além do empobrecimento mental de toda uma população.
Com altos ganhos de atravessadores, intermediários, transportadores, postos de combustível. Tudo caro pra chuchu, sem trocadilhos, e amarrados ao dólar!
Mas nos últimos anos, a agroindústria tomou uma vertente espetacular e está salvando a pátria.
Agora, se vocês prestarem atenção às notícias que não nos querem dar, verão que essas grandes fazendas e cooperativas agrícolas, de grãos, estão sendo vendidas para empresas no exterior. Advinha de onde! Advinha quem está comprando!

Em breve, o Brasil, todinho, vai sofrer as mesmas coisas que sofreu Pesqueira, nesses últimos cinquenta anos. Vai virar um Grande Vale do Mimoso! Somente bonito!
Um país não pode manter sua liberdade e sua dignidade, sem ter seu exército, suas armas, sem produzir sua comida, seus remédios.
Depender de mão de obra externa. De produtos externos, de ideias externas! De defesas externas?!
Confiando sua ciência às pesquisas e pesquisadores dos outros; trocando seus meios de produção pelo comércio exterior; garantindo seus medicamentos através da importação dos produtos, de laboratórios estrangeiros; a ponto de não termos máscaras de proteção, porque temos que importa-las?
De não testarmos os vírus porque não fazemos os testes; de não respirarmos porque não fazemos os respiradores! E, parece, não estão querendo nos vender.
Além dos respiradores, acho que daqui a pouco vamos ter que importar oxigênio, em dólar!
Nossa situação anda tá precária, que o âncora de um grande jornal, de uma grande mídia, elogiou os pernambucanos por estarem utilizando a ‘ciência’ para controlar a virulência, através dos drones.
Ciência não! Cara, Isso é Tecnologia! Aliás, nem isso, já que os pernambucanos não criaram os drones, apenas, Técnica! Técnica de uso. Uma grande ideia, mas, apenas, técnica! Aqui, a burrice é transmitida no horário nobre.
Oxalá, fosse apenas a burrice!
E ai gente! Como vamos fazer nosso próximo carnaval se não produzimos sequer nossas plumas e paetês, e aquelas sombrinhazinhas para pular o frevo?
Como vamos fazer as festas de S. João se os balõezinhos, da mesma forma que as pequenas sombrinhas do carnaval, vêm da China?
Se essa peste, desse coronavírus, além de nos prender em casa e arrasar nossa economia (vocês vão ver!) Servir para acordar esse gigante imbecilizado, de seu berço esplêndido, acho que já cumpriu seu papel, com honras e louvores.
Se nos servir para pensarmos e observarmos melhor, tudo que nos dizem, antes de saímos correndo atrás, como o ‘pintinho ingênuo’ da última coluna, então será a gloria total
E, se, por fim, reduzir pelo menos boa parte das características desse país de tolos, de memória fraca, venal e preguiçoso, então é agradecer a Deus pela pandemia e pedir que, de vez em quando, ele no mande outra.

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